quinta-feira, 19 de maio de 2011

Uma história simples...(012 – Isolado...)

Ele foi embora hoje. Depois de várias conversas para tentar dissuadi-lo da viajem, Ezy foi embora. A Luana ainda me disse que eu teria sido a única pessoa a convencê-lo de ficar. Mas ela não sabia de tudo. Há coisas que não consigo pedir ao Ezy. Estou em dívida... a nossa história foi suja. Por mais que sejamos irmão gêmeos eu sinto que o fim da nossa amizade fraterna está ainda por um fio. O que aconteceu entre a Isa e eu foi como uma pequena bomba de nêutrons naquele pequeno grupo. E como nunca chegamos a falar sobre o assunto, ficou tudo muito tabu, muito encoberto. Cada um se recolheu no seu canto para lamber a feridas e recuperar forças. Nem o Ezy e eu conseguimos conversar. Eu teria preferido que ele me batesse, me insultasse, fizesse alguma coisa. Mas não. Simplesmente evitou tocar no assunto e a vida continuou como se nada fosse. É estranhíssimo porque parece que esse momento das nossas vidas simplesmente deixou de existir. E como o resto da família não sabe de nada e as meninas simplesmente desapareceram do nosso circulo de amigos, ninguém acha anormal. A Taby nunca mais atendeu os meus telefonemas, deixou de freqüentar os lugares e pessoas que tínhamos em comum. Ainda mora no mesmo bairro, uma vez fiquei umas horas frente à casa dela só para ver se ela estava bem. Ela chegou com um grupo de pessoas que eu não conhecia e entrou em casa. Eu esperei um pouco e fui embora. Não teria sabido o que dizer.

A Isa também desapareceu. Não sei se ela e meu irmão chegaram a conversar alguma coisa. Só sei que ela se mudou para outro estado. Com ela tinha acabado a graduação dela, foi para a Califórnia, salvo erro, para uma especialização na UCLA. Eu também não consegui sequer devolver os CDs que tínhamos trocado.

E Ezy foi para o Cairo. A idéia dessa viagem para o Cairo pairava no grupo desde que a Taby tinha falado no assunto. A proposta era uma viagem em grupo. Não aconteceu assim... ele foi sozinho, no que eu entendo ser uma tentativa teimosa de encerrar um ciclo, talvez. Passaram-se meses sem noticias dele. A família estava preocupada mas eu sabia que ele estava bem. O problema era que a Lua ia se casar e queríamos tentar reunir a família toda pelo menos uma vez. O Yuri ia voltar da Europa onde estava num desses student-exchange, a Lua já aqui estava, mas do Ezy, nada. Ele nos tinha avisado para só entrar em contato com ele em caso de urgência. Tentamos várias vezes para o numero que ele nos tinha passado e nada. Por mais que eu dissesse sempre para a família que ele estava bem, que não precisavam se preocupar, a verdade é que eu desde a partida dele que sentia uma angustia permanente. Não consegui distinguir se era mesmo unicamente a questão do afastamento – era a primeira vez desde o nosso nascimento que estávamos tão longe – ou se era a continuação da reação ao drama da separação.

E foi assim que surgiu a idéia de eu ir buscá-lo lá. Achei que as 14 horas de viagem de volta não poderiam ser feitas em total silencio e seria então uma oportunidade de ajustarmos contas sobre o sucedido. Essa foi o plano que me fez passar por casa numa tarde de novembro, arrumar meia dúzia de roupas numa mochila, torrar parte do cartão de credito numa viagem para o Egito, sem pensar em avisar absolutamente ninguém. Com o recuo reconheço que deve ter sido assustador para quem ficou sem noticias. Sobretudo porque eu sempre tinha sido tão certinho, compenetrado. Mas a causa era boa. Assim de repente desapareci do mapa durante 2 ou 3 dias, o tempo da viagem que deu a volta ao mundo até finalmente chegar ao Cairo.

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David
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Um comentário:

  1. Faz tanto tempo que não participo que já não lembro como postar... É para mandar por e-mail ou deixar comentário? Bem, vou deixar por aqui o que seria a parte 13:

    Passei bem os últimos dias, cumprindo o que estava previsto em minhas anotações de "para visitar no Egito". Consegui até mesmo agendar um encontro com o historiador Richard Lebeau, que veio ao Cairo para uma conferência sobre história das religiões. Quando vi seu nome indicado no folheto da conferência, não resisti e fiz minha inscrição. Foi muita coincidência estar aqui nesse momento. Eu tinha lido seus livros sobre o Oriente Médio na faculdade e tinha muitas dúvidas, muitos questionamentos a fazer. Após sua palestra, aproximei e me apresentei: "Tábata, formada em história e sua fã". Que ridículo, mas foi assim mesmo...

    Apesar da péssima apresentação, foi empatia à primeira vista. Conversamos por mais de meia hora ali, em pé, até que os organizadores do evento pediram licença para fecharem as salas... saímos para continuar a conversa em um café e o encontro terminou com um jantar no tímido Alfi Bey, onde pude experimentar cozinha egípcia tradicional, acompanhada por um especialista no assunto. Foram horas falando sobre história, evolução da humanidade, rumos das religiões... Foram momentos inesquecíveis.

    Após o jantar, Richard me deixou no hotel, trocamos endereços de e-mails e promessas de continuarmos nossas conversas sobre história, historiadores, civilizações e religiões via internet. Ao entrar no elevador do hotel, ouvi a risada de Isa, grande amiga que fiz na faculdade. Voltei para procurá-la, em um gesto instintivo. Então, me dei conta da bobagem. Só poderia ser uma risada parecida... há tanto tempo eu não a ouvia. Desde que ela mudara para a Califórnia, ao fim do curso de Filosofia. Verdade que tínhamos pensado muito em vir para o Cairo, juntamente com Tiago e seu irmão. Mas não aconteceu. O grupo se dissolveu antes e ela nem imagina que eu estou aqui agora.

    De volta ao quarto só consigo pensar nessas imagens do passado que me perseguem aqui. Outro dia o Tiago, no café. Agora, a Isa. Pessoas tão presentes por tanto tempo, que se perderam de forma tão rápida, tão contundente. Uma amiga, um namorado, uma aventura... Tudo é passado e lá deve ficar.

    Racionalmente eu sei que é assim. Mas na prática, não consigo fazer. É como se quisesse estar com eles novamente, a todo instante, fazendo a viagem que sonhamos e tanto falamos. Queria que nada tivesse acontecido como foi, que nada tivesse estragado nossos planos, nada tivesse mudado o rumo tão simples de nossa história.

    E com isso voltam minhas alterações de humor. Por que, mesmo sendo tão jovem, e com a consciência de que ainda vou ter muitos amigos, namorados e planos perdidos pelo caminho, só consigo pensar agora que o melhor seria acabar com tudo, com toda essa história? Ou, ao menos, nunca mais voltar a lugares onde já estive e nem seguir pelos lugares que planejei com eles?

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